- Guilherme Lopes Lacerda
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Predadores: A Obsessão - Capítulo 8
O grupo encontra o originador do metrô
No sétimo capítulo o grupo enfrentou ainda mais inimigos e se aprofundou no território, onde viram vagões em que as criaturas enferrujadas trabalhavam trocando engrenagens. Ao fim, chegaram em uma porta de madeira bonita. Decidiram atravessar e enfrentar o dono do território.

Fernando sentiu um frio que percorria o interior dos ossos se manifestando como músculos retesados. Estavam preparados? Realmente preparados? Nicolas não parecia preocupado, mas poderia confiar nele? Parte de si acreditava, o homem os protegera e os salvara, não os enganaria em um momento tão crucial. Então, mesmo sabendo disso, por que as mãos tremiam? E mesmo com suas mãos tremendo, por que aceitou continuar avançando?
Antes que pudesse chegar a uma resposta, Bárbara abriu a porta à frente do grupo. Quando deu por conta já estavam na sala seguinte. Seu olhar foi atraído para o predador sentado em uma espécie de cadeira no centro. Não, cadeira não, era um trono enferrujado. O monstro era enorme. Mesmo sentado como um rei preguiçoso, quase alcançava o teto. Apesar da forma humanoide, lhe faltavam muitas características humanas. A pele era branca e reflexiva, semelhante à porcelana, não possuía pelos ou roupas no corpo, seu rosto era apenas um buraco na cabeça, revelando um interior vazio.
Seu foco inteiro estava naquela face, naquele nada. Foi só quando Nicolas passou a mão em frente aos seus olhos que notou o quanto estava absorto. O fascínio foi trocado por nojo, repulsa pura manifestando-se em uma contorção no rosto. Procurando qualquer outra fonte de distração, olhou para o resto da sala onde estavam.
Era circular e possuía pé-direito de quase dez metros, suas paredes de metal eram limpas, sem engrenagens ou ferrugem. Um vidro que cobria a parte superior de uma parede mostrava o caminho à frente e os trilhos. Um painel cheio de botões, monitores e gráficos ficava logo abaixo da janela. Um homem magro e franzino, sem as manchas de ferrugem, observava o painel, apertava botões e corria de um lado a outro.
— Cuidado! — gritou Bárbara.
O grupo se separou e tudo que Fernando viu foi um borrão aproximando-se em alta velocidade, atingindo-o no tronco e lançando seu corpo para trás. A sala rodopiou e parou de lado. Ele tentou reunir ar para pedir ajuda, mas o ato de inspirar doeu-lhe o tórax. Conteve um berro a contragosto, deixando a dor escapar em forma de lágrimas. Levou a mão ao peito e sentiu uma nova pontada de dor. Um peso na perna o fez temer que ela estivesse em situação pior, mas encontrou apenas uma pessoa manchada jogada em seus pés. Apoiou as mãos no chão, instigando mais agulhadas nas costelas e chutou o enferrujado para longe, que não ofereceu resistência, ficou apenas ali, atirado no chão como um objeto descartado.
Olhou na direção do originador e viu que ele endireitara a postura, a mão direita segurando fortemente um dos braços do trono, como se tentasse arrancá-lo e então algo se soltou: outro indivíduo manchado. Não era um assento feito de metal enferrujado, e sim de pessoas comprimidas, dobradas, quebradas e deformadas. Tudo conforme a vontade de seu senhor para que lhe servissem como móvel.
O rosto do predador virou-se em sua direção. Fernando continuava sendo o alvo. Não podia deixar isso acontecer. Quem cuidaria dos ferimentos do grupo? Buscou se erguer, a dor no peito impedindo que fizesse movimentos bruscos demais. Uma sombra se pôs à sua frente e cordas se materializaram, tentando restringir os movimentos do homem de porcelana, mas arrebentaram tão logo ele continuou o lançamento. O projétil humanoide atingiu Bárbara como se batesse contra uma viga de metal. Chocou-se e girou para o lado, caindo a alguns metros dela. Nas costas da jaqueta da mulher, duas labaredas surgiram, pequenas e inofensivas.
O inimigo preparou-se para arrancar mais uma pessoa do trono. Dominique disparou rumo ao originador e deu um salto impossível na direção da criatura que tinha mais de cinco vezes o seu tamanho. Ela chegou perto da cabeça, mas o predador reagiu e, com o dorso da mão, em um tapa quase casual, acertou a senhora com força arrebatadora o suficiente para jogá-la na parede e fazer o corpo quicar contra o metal. Não houve movimento quando ela caiu no chão. Fernando venceu a dor e gritou seu nome. Sem resposta. Onde estava Nicolas quando precisavam?
Como se respondesse a seus pensamentos, o líder se aproximou pela lateral.
— Você está bem? — perguntou ele, com voz calma.
— Claro que não! Temos que sair daqui, não estamos preparados!
— Está vendo alguma saída?
Fernando correu a sala com os olhos, zero portas. Bárbara foi atingida mais uma vez e as labaredas cresceram.
— Use sua corda! Enforca ele!
Nicolas olhou na direção do originador. Fernando viu a corda se constringindo contra o pescoço do homem, e uma réplica surgiu no alvo, mas sem efeito algum.
— Já tentei. — Ele aliviou o aperto. — Não funciona.
— Tu… Nós estamos condenados.
— Não acabou ainda.
— O que vai…
Nicolas levou um dedo aos lábios. Seus olhos percorriam a sala como se fosse uma máquina. Foi um momento que se estendeu por eras. Bárbara foi atingida repetidas vezes, cada lançamento parecendo mais forte que o anterior. Entre um golpe e outro, ela fitou-os com olhos marejados e o rosto tomado pela ferrugem.
— Aguente mais um pouco, estamos quase lá! — Fernando mentiu a contragosto.
A mulher assentiu e voltou os olhos para frente. Os de Nicolas pararam de vasculhar a sala e focaram-se em Fernando.
— Tem um padrão, o metrô inteiro foi montado para ser sustentado pelas pessoas com manchas. O próprio originador as usa para nos atacar, é dependente dos outros — disse ele, a voz saindo mais rápido que o normal. — Precisamos acabar com esse vínculo.
Fernando olhou para o painel que vira antes, onde se meteu aquele homem? Uma parte dos controles estava oculta pelo originador. Apontou na direção do vidro.
— Tem outra pessoa nessa sala, deve ser uma espécie de maquinista.
— Eu vou até lá. — Nicolas assentiu.
— Tu não vai ficar bem se for atingido por uma daquelas coisas…
— Não serei. Apoie Bárbara, vai ficar mais difícil para ela.
Fernando viu a corda se apertando forte no pescoço de Nicolas e sua esclera tornou-se vermelha de sangue. O originador inclinou-se para frente no trono e arrancou pessoas com as duas mãos, lançando-as em Bárbara na sequência. Tirou mais duas e jogou novamente, e mais uma vez. Estava mais rápido, mais focado, mais obcecado. Nicolas aproveitou o momento para ir correndo na direção do painel.
— Mais um pouco! Nicolas descobriu como derrubar ele! — gritou Fernando.
Bárbara assentiu, as asas nas costas da jaqueta pulsando em um vermelho intenso. Os ataques do originador continuaram focados nela, que não se movia um passo e deixava as rachaduras espalharem-se pelo seu corpo como nunca. Fernando admirou a força de vontade da companheira.
O monstro estava prestes a fazer mais um lançamento quando pareceu congelar, o frio que tomava Fernando desde que entraram sumiu. A pele de porcelana encheu-se de rachaduras e pedaços caíram pouco a pouco em uma chuva de cacos. O originador passou de um rei no seu trono a um déspota em decadência. Atrás de tudo isso, Fernando viu o homem franzino sendo enforcado por Nicolas. Mesmo suspenso no ar, esticava suas mãos na direção do painel e gritava.
— Não! Não! O metrô não pode parar, tem que continuar! Ele pediu para continuar! Devo continuar!
Ele se debatia, arranhava o próprio pescoço, tentava tirar a corda. Nada do que fazia tinha efeito algum. Quando o homem parou de se mexer, uma pressão incômoda deixou o peito de Fernando, e soube que poderia fugir do território. Nicolas olhou na direção do grupo e gritou:
— O farol! Pensem no farol.
A sala inteira rachou-se em seguida e os olhos do padeiro buscaram a companheira caída.
— Dominique! — gritou ele.
Não houve resposta dela, mas Nicolas tomou ação e correu até a idosa, tomando-a nos braços. Um tremor percorreu a sala, desequilibrando Bárbara e trazendo uma sensação ruim para Fernando. Obedeceu a Nicolas e pensou no farol.
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